Artigo | Percival Puggina*
Impossível escrever sobre liberdade e não afirmar de imediato: hoje observo no Brasil o mesmo medo que os cubanos têm do Estado, do MININT, da militância do Partido e dos agentes dos Comitês de Defesa da Revolução – CDRs. O que percebo é muito semelhante ao que experimentei estando lá, quando soube e vi que era observado e filmado pelo regime em virtude de conversas que tive, por telefone, com líderes da oposição cujos aparelhos estavam grampeados. Decorre dessa experiência a compreensão de que a liberdade, no Brasil, está sob ataque. Impossível negá-lo quando pensamos nas restrições à liberdade de expressão, no patrulhamento das redes sociais, nos robôs farejadores do ciberespaço, na censura de conteúdo sendo superada, em número de ocorrências, pela censura aos autores, com supressão de seu direito de trabalhar em comunicação social e o bloqueio de seus ganhos.
Tudo fica ainda mais alarmante quando pensamos na liberdade de pensamento. “Livre pensar é só pensar”, dizia o notável Millôr Fernandes nas suas páginas semanais da revista O Cruzeiro. Será, mesmo, que pensamos com liberdade, no silêncio da nossa mente? Não esqueçamos que para pensar dependemos do vocabulário que temos e das ideias, fatos e interpretações que nos chegam. Não percamos a consciência de que todos esses suprimentos do livre pensar estão crescentemente manipulados pela militância da mídia, da cultura e da Educação. O horizonte do livre pensar vem sendo reduzido, trazido à ponta do nosso nariz e nosso pensamento se contrai ao que possa ser operado com o limitado conteúdo de uma predeterminada caixa. Quantos brasileiros conseguem pensar fora dela?
Quem a transgride tem por destino o confinamento no gulag dos excluídos, onde o silêncio é o preço da verdade. Em muitos casos, o que sobrevém depende inteiramente da vontade de alguém com mão pesada e muita tinta na caneta.
Por isso, a liberdade está em perigo e seu futuro é incerto. Para recuperá-la, precisamos fazer o que não fizemos enquanto os inimigos da liberdade ocupavam todos os espaços. A lista é longa. Há que fazer como o apóstolo Paulo e infiltrar o coração do Império. E há também que criar movimentos, promover eventos, formar líderes (especialmente líderes jovens), motivar lideranças e apoiar quem, por cargos e verbas públicas, não vende a liberdade, a democracia e o estado de direito. É preciso mobilizar e influenciar instituições privadas e públicas, estar presente nas universidades, enfrentar o sistema dentro do sistema, apoiar a maioria liberal e conservadora na Câmara dos Deputados. Em 2024, eleger nossos vereadores e prefeitos, diminuir a influência dos partidos “comerciais” para reduzir o balcão dos negócios e o número dos negocistas. Devemos ter bem nítido o que queremos e o que não queremos para nosso município, nosso estado, nosso país e para nós, como cidadãos.
Se somos empresários, façamos o que nos cabe em nosso círculo de influência e possibilidades de ação. Que as extrapolações formuladas sobre os recentes acontecimentos com vinícolas de Bento Gonçalves e Garibaldi nos sirvam de motivo para reflexão. É com a soma do trabalho de todos, conscientizados, motivados, que, aos poucos, restituiremos ao povo brasileiro a dignidade que a liberdade proporciona.
*Membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
O escritor palestrou na RA CIC Caxias em 15 de fevereiro de 2023 sobre o tema “O futuro da liberdade”.